Uma defesa da poesia em uma reposta de Nick Cave

Sergio de Souza
3 min readApr 9, 2021

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Pergunta e reposta número 142 de The Red Hand Files

(tradução: Sérgio de Souza)

Nick Cave e sua esposa, Susie Bick Cave

Estou lendo ‘Break, Burn, Blow’, de Camille Paglia, e acho interessante que todos os “43 dos melhores poemas do mundo” nele contidos tenham sido escritos em inglês e, em sua maioria, sejam anteriores ao século XX. Estou curioso para saber quais poemas deste volume são seus favoritos. Eu apostaria um trocado em John Donne com John Berryman correndo por fora. DAVID, PORTLAND, EUA

Quero tentar ler mais poesia, mas realmente não sei por onde começar. Você pode sugerir algum poeta que eu pudesse ler para me animar? ANGELA, NYC, EUA

Tem algum ‘causo’ do Warren para contar ? ELIZABETH, ADELAIDE, AUSTRÁLIA

Nick Cave lendo poesia

Caros David, Angela e Elizabeth,

Num dia de verão em 1996, Warren, eu e nossa amiga Tara-Jane, decidimos alugar um barquinho e remar no rio Serpentine, no Hyde Park. Fazia um dia glorioso e ensolarado, e enquanto eu me reclinava na extremidade do barco e Warren sentava-se desconfortavelmente na proa, Tara-Jane remava feliz. No meio do lago, Tara-Jane guardou os remos e flutuamos entre os patos. De repente, sem avisar, lá da frente, Warren começou a recitar decor “A pulga”, de John Donne. Fiquei muito impressionado, porque é um poema bem longo, e nós dois estávamos inacreditavelmente chapados. Depois de um tempo, meio que adormeci. Quando acordei, Tara-Jane estava dormindo, os patos e o sol haviam sumido e Warren ainda estava recitando “A pulga” de John Donne, o que diz muito sobre a incrível resistência do meu amigo e sua infatigável e perene capacidade de se comunicar. Foi um dia amável.

Consequentemente, tenho uma queda por John Donne, assim como pelo deslumbrante “Break, Blow, Burn” de Camille Paglia. Camille dá um mergulho profundo e apaixonado em seus poemas favoritos, incluindo “A Pulga” e uma análise assustadoramente escandalosa do “Soneto Sagrado XIV” de John Donne.

David, Camille Paglia explica no prefácio o porquê de haver incluído apenas poemas em inglês — o problema real da tradução, e por causa de seu amor maravilhosamente meticuloso pela língua inglesa. Metade dos poemas em “Break, Blow, Burn” são, na verdade, poemas do século XX. Mas você está certo, nunca há o suficiente do grande John Berryman. Para mim, pouco importa se gosto dos poemas que Camille Paglia escolheu para “Break, Blow, Burn” ou não. Suas leituras profundas são reproduzidas de forma tão cuidadosa e única, que se tornam pequenas, mas profundas lições sobre como amar a poesia, enquanto ela examina o que está contido no cerne de um bom poema. O livro é uma defesa muito necessária da beleza em si e, Angela, um meio bastante abalizado para começar um relacionamento com a mais abundante das formas de arte — a poesia.

Com amor,

Nick

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Sergio de Souza
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Written by Sergio de Souza

Trabalho com produção de conteúdo textual. Brinco de traduzir The Red Hand Files.

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