“Tudo a seu tempo”
Red Hand Files — Edição nº 151 / junho de 2021
(tradução: Sérgio de Souza)
Estou te escrevendo em nome de minha tia Marnie, que está impossibilitada de o fazer, consumida pela dor. Ela perdeu seu único filho, Tristan, por conta de um derrame, aos 49 anos. Estamos todos tomados de tristeza e lamentamos a perda de seu filho, mas sua situação é completamente outra. Não consegue ver ninguém. Não consigo alcançá-la. Sua risada que a todos nos alegrava, se foi. O que eu posso fazer? O que posso dizer? Todos a amamos, mas sentimo-nos tão impotentes. O que fazer para começar ter de volta nossa tia Marnie ?
IAN, SYDNEY, AUSTRÁLIA
Caro Ian,
Em minha experiência, percebo a existência de um lugar especial reservado às mães que perderam seus filhos. Seu pesar, uma espécie de dor torturante, complexa e singular, diferente de qualquer outra dor, e o impulso fundamental para se fechar, isolando-se do mundo, é natural, e talvez necessário. É uma forma de sepultamento autoimposto, uma aproximação da eternidade, onde podem aproximar-se daquele que perderam. Tia Marnie está fixada na imagem de seu filho que se foi, e talvez não haja espaço para você neste momento. Talvez agora não seja o momento em que ela precise de você, mas pode ter certeza de que chegará o tempo desta necessidade.
Lembro-me, mais uma vez, da vigília de Maria Madalena na entrada do túmulo de Jesus. Depois que Jesus foi sepultado, a pedra foi posta na entrada da caverna e os doze apóstolos fugiram, mas Maria Madalena permaneceu “parada em frente ao túmulo”. Esta vigília silenciosa e vulnerável é, para mim, o momento mais comovente do Novo Testamento. É neste ponto que você se encontra agora, Ian, tendo perdido não apenas seu primo, mas também sua amada tia Marnie.
Provavelmente sua tia voltará para você. Pode ser em breve ou pode demorar mais algum tempo. Isso se dará por meio de uma surpreendente coragem e provavelmente por um processo bem sofrido e gradual. Ela vai olhar em volta para ver quem está ao redor. Algumas pessoas devem ter se afastado, pois o nível de sua compaixão foi inferior à magnitude ao desespero de sua tia, mas deixe-me apenas dizer uma coisa — ela jamais esquecerá aqueles que persistirem, pois permanecer firme nas fronteiras da dor do outro pode ser o maior e mais sagrado ato de amor realizado por alguém. Seja paciente com a tia Marnie.
Li sua pergunta para Susie esta manhã. Ela está sentada sob um raio de sol que entra pela janela de nossa cozinha, com seu cachorrinho psicótico, Nosferatu, em seu colo.
“Tudo a seu tempo”, ela me pediu que lhe dissesse.
Com amor,
Nick