As pequenas virtudes de Natalia Ginzburg
Natalia Ginzburg — a vida sai de sua pena como se não saísse: jorra a memória feito fantasia, a reminiscência feito poesia. Fato é ficção; literatura, realidade. Os pequenos ensaios parecem contos, onde a fada é esposa, mãe, mulher, judia, italiana e os duendes são filhos retirados do sono em meio à explosão da guerra e os cenários são o interior, a cidade ameaçada pela guerra, a vida doméstica. As relações são tão humanas e mais deliberadamente “natalianas” do que quaisquer outras e a escrita, eivada de um humanismo quase místico, sentido de transcendência e sabedoria, revela uma escritora que é uma filósofa, uma contadora de histórias; uma ensaísta da memória, ou uma registradora do tempo transformado em prosa semi-poética.
Natalia Ginzburg esbanja delicadeza sem resvalar no sentimentalismo, é autobiográfica sem ser autorreferente. A escrita de si retrata um cotidiano, uma vida, uma época que poderia ser a nossa, uma cidadezinha que poderia ser a sua, traumas e sonhos que habitariam nossas casas, sonhos sapienciais que poderiam- e podem- ter sido sonhados para nós, leitores afortunados destas Pequenas Virtudes.