“American Standard”: James Taylor tentando (e conseguindo) juntar as pontas…

Sergio de Souza
3 min readAug 12, 2020

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James Taylor é outro sujeito que está lutando para juntar as pontas da vida. E pelo que vi no making off do álbum, disponível no YouTube, lutando com muita serenidade; tentando fazer o garoto encontrar-se com o ancião. Afinal de contas, “o menino é o pai do homem”.

Neste “American Standard”, seu 19º disco de estúdio, escolhe 14 canções americanas clássicas (standards) dos anos 20, que marcaram sua infância (segundo o próprio, época em que começou a interessar-se pelos detalhes da feitura de canções) e nos entrega mais um álbum que, se não prima pela originalidade (Taylor não precisa mais disso, atingiu um patamar tão elevado que pode dar-se ao luxo de até “brincar” em discos, e como brinca com simplicidade, leveza e sofisticação tão mágicas, suas versões são pura delícia, como fez Paul Simon — embora de maneira muito mais séria e introspectiva com suas próprias canções — em seu ótimo “Into the blue light”), é um ótimo presente de início de ano. Lembrando que, falando em originalidade, Taylor brindou-nos com um belíssimo álbum de estúdio em 2015: “Before this world”.

James Taylor está em tão grade forma que este disco poderia ficar no repeat por horas. Sua voz, que fica impressionantemente melhor com os anos, e seu violão tão característico, deslizam suavemente por estas canções, imprimindo sua identidade musical de maneira tão marcante, que a gente chegaria a pensar que são canções do próprio compositor, se já não as conhecêssemos de “outros carnavais” (e outras “vitrolas”, ou outros filmes). Doce e mágica nostalgia. Bernanos disse certa vez: “escrevo para o menino que fui”. James Taylor parece estar cantando e tocando para o menino que foi. Juntando as pontas da vida.

O interessante é que os standards pedem o piano, a orquestra, arranjos “cheios” e pomposos, mas James Taylor optou pela simplicidade e, em certo sentido, por certa limpidez acústica (ele conta que quis montar um recinto em que “ecoassem” bem a voz e os instrumentos). Os arranjos são baseados nos violões muito bem casados/combinados de Taylor e de John Pizzareli, que também é produtor do disco. Há inserções de violinos, clarineta, sax, trumpete que dão um toque mais caracteristicamente jazzístico ao trabalho.

Claro que os puristas retornarão às versões canônicas e torcerão seus narizes. Mas eu acho que estas versões, pela sua pungente simplicidade, têm tudo para também tornarem-se consagradas pela história.

James Taylor é aquele tipo de artista que, por sua história e personalidade musical, atingiu um status tão grandioso que tem o direito de fazer o que bem entende a essa altura da carreira. “American Standard” é um projeto brilhante, bem planejado e de extremo bom gosto. Claro que esperamos ardentemente que ele não queira multiplicar a ideia e fazer aqueles songbooks insuportáveis à la Rod Stewart. Até mesmo Dylan já gravou dois discos assim (um muito bom e outro meia boca). Taylor poderia, se quisesse, repetir a dose. Confiamos em sua voz e em seu violão.

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Sergio de Souza
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Written by Sergio de Souza

Trabalho com produção de conteúdo textual. Brinco de traduzir The Red Hand Files.

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